Jornada do Escritor: Dia 5 de 30

Andressa Santos
5 min readFeb 5, 2021

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Dia 5: Sem pesquisas, sem desculpas

Escreva sobre algo pelo qual você se interessa e sabe muito bem e virou um expert neste assunto. Uma dica especial? Uma receita infalível? Um lugar que ninguém conhece? Um dia especial que passou em sua vida?

Especialidade em um assunto? Só depois de uma intensa camada de pesquisas e muitas vivências. A minha especialidade é o conhecimento sobre a minha cidade, Lins, interior de São Paulo. Conhecida pelo lema “Do café e da escola, emergiu Lins”, esse município conquistou a sua emancipação no dia 21 de abril de 1920, e guarda muitas histórias inusitadas e um contexto histórico cativante. Através do cruzamento de uma antiga trilha indígena (índios Coroados, naturais da região) e a construção da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, traçada por Marechal Rondon e seus homens, muitas famílias passaram a povoar este espaço, recebendo o nome de Santo Antônio do Campestre. Expondo-se brevemente, seu nome passou por vários processos, dentre eles, Albuquerque Lins, em homenagem ao presidente da província do Estado de São Paulo (conhecido agora como o cargo de governador), e, finalmente, Lins.

Particularmente, se você, que nasceu na cidade ou veio apenas como um morador temporário, parar para olhar ao seu redor, não importa em que bairro esteja, e não encontrar nada que pareça especial, você está certo, não há como perceber. Mas se buscar pelos jornais, pelo atual museu (que era uma antiga estação de trem, próximo à rotunda), e pela biblioteca (onde abrigava o banco do brasil), ou melhor, buscar por um grupinho de moradores antigos reunidos presencialmente e nas redes sociais, é certo de que irá encontrar muita coisa. É uma região pequena, de quase oitenta mil habitantes, fragmentado verticalmente em duas partes pelo tão conhecido rio campestre, que atravessa do norte ao sul da cidade. Quando chove com muita intensidade, o melhor a se fazer é esperar o alagamento passar antes de tentar ir para o outro lado.

No que se refere ao clima, saiba que o asfalto é como lava que não se esfria nunca. E a chuva, uma companhia rara que ameaça sem provas, quando não leva um nocaute das altas ventanias do verão, caí feito dilúvio, mas o arco-íris sempre aparece depois. Não adianta olhar previsões do tempo, a chuva não virá de propósito, e o sol amanhece com um bom dia de quase trinta e oito graus. Sim, eu ainda estou falando apenas sobre uma parte do sudeste no país. Esta é a famosa que bate o ranking acima dos quarenta graus de temperatura todos os anos. Apesar disso, é bom ser uma sobrevivente por aqui.

Muitas pessoas reclamam que a água tem um gosto diferencial, logo, ruim. Eles estão equivocados. A água de Lins, comparada à água medicinal da cidade de Vichy, na França, é definida como Alcalina Bicarbonatada, pois o seu pH está mais próximo do nível de acidez sanguíneo, considerado ideal para consumo e prevenção de doenças. Quem diria que um poço cavado à espera de petróleo encontraria uma fonte tão rica direto do aquífero guarani? Dentre tantos meios de desenvolvimento, como, a princípio, a exportação de café que enriqueceu o imigrante grego Nicolau Zarvos, geração de empregos com o antigo aglomerado Grupo Bertin,(que pertence atualmente à empresa JBS) saúde e educação com a união de comunidades religiosas que fundaram e administram Universidade e centro hospitalar público, é necessário destacar a diversificada cultura presente na cidade promovida pelos seus imigrantes ao longo dos anos.

O município é enriquecido por inúmeros patrimônios religiosos e culturais. O monumento da mulher peruana, que marca a irmandade entre Lins e Arequipa, cidade do Peru, homenageia as suas mulheres. Houve uma intensa concentração de imigrantes japoneses que construíram seus próprios templos. Existe até mesmo uma rua japonesa no centro da cidade onde está o portal Torii, um portão tradicional dessa cultura. Além do famoso Teisuke Kumassaka, Manabu Mabe, um pintor, viveu por anos em Lins e a eternizou com a imagem de um bairro em algumas de suas pinturas. Mário Prata, um grande escritor que viveu aqui a sua infância, a usou de inspiração para a produção de sua novela “Estúpido cupido”. Há apenas um templo grego, e várias igrejas protestantes que aumentam a cada dia e cresce o número de suas orquestras. Do mesmo modo, a OSJL, Orquestra Sinfônica Jovem de Lins, está sempre presente em concertos natalinos. E não importa em que posição geográfica você esteja, sempre há um modo de identificar uma igreja católica renascentista ou a Catedral Diocesana com o seu estilo gótico, para enfim usar como um norte, se localizar, e conseguir voltar para a casa.

A praça Coronel Piza, onde marca o ponto zero da cidade, abriga túmulos de três corajosos soldados mortos na Revolução de 1932. Além desses, não se pode esquecer da presença de nossos soldados, durante a Segunda Guerra Mundial, pertencente ao III do 6° Regimento — hoje, 37° Batalhão de infantaria leve — , comandado pelo Major Silvino Castor da Nóbrega, fazendo parte do primeiro escalão da FEB em julho de 1944, estando entre as primeiras tropas brasileiras que pisaram em solo italiano participando dos primeiros combates. Do mesmo modo, há um reconhecido nome, Gil Schueler Moura, que foi 2° tenente aviador da FAB, e frequentou a base aérea Randolph no Texas, Estados Unidos. Se tornou superintendente, ao lado de sua esposa, Aurora Ariano Moura, da Fundação Gil Pimentel Moura, uma entidade assistencial linense fundada pelo seu pai em 1952.

Para aguçar o espírito escritor que há em você e ajudá-lo a ter ideias para participar dos concursos literários da Academia Linense de Letras, saiba que por volta de 1968, uma simples enfermeira que trabalhava em um sanatório isolado da cidade — hospital Clemente Ferreira — presenciou, como ela mesma chegou a dizer, uma nave em formato de disco que pertencia a uma mulher estranha que estava em sua direção, clamando por “imbaúra, imbaúra”. O fato virou notícia nacional, mas não sabemos até hoje o que realmente a mulher queria dizer com aquilo.

Existem muitos outros assuntos que a chamada “princesa do Noroeste” pode nos apresentar, mas enquanto não estamos descontraídos em uma calçada fresca, deixemos a continuação para mais tarde.

“A vida é escrita em curtas frases e não em grandes livros, por isso, escreva uma frase de cada dia porque escrever um livro completo, de uma vez só, é perda de tempo!” - Gherheai

MoDE - Movimento da Escrita Brasil

Andressa Santos

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Andressa Santos

Leitora ativa. Escritora amadora. Estudante de violoncelo. Uma antissocial que tem amor pela humanidade ✝