A simplicidade de um homem
Numa certa manhã, deparei-me com um ritmo bem conhecido por muitas pessoas. A canção vinha de um senhor humilde, alguém necessitado, mas que não estendia, naquele momento, as suas mãos buscando a compaixão de ninguém. Carregava uma pequena bagagem de cobertas e uma bolsa infantil envelhecida, o que poderia significar que ele realmente não tinha um lugar permanente. A questão social é completamente visível aos nossos olhos. Em um período pandêmico, a instabilidade aumentou, e com ela, muita angústia. Este cenário vai muito além do que uma atuação dos três poderes. Mas o que trouxe maior impacto no que vi, foi o seu espírito.
Muitas pessoas pararam por causa do sinal de trânsito, passavam às pressas pelas calçadas ou esperavam distraídas que a sua fila dentro de um estabelecimento finalmente andasse. Todos tinham uma tarefa, um problema, uma motivação. Estavam cheios do muito, mas quem tinha tudo era aquele homem. Eu o vi completo, não como alcançar o nirvana por meio de um estado de miséria no mundo ocidental, nem para romantizar a pobreza. Como uma criatura que não se abalava mais, com uma certeza diária que não se limitava aos afazeres de uma rotina. De esperança viva e pessoal que trazia disposição para viver o presente.
Através do hino, em que repetia-se inúmeras vezes: “Porque Ele vive, posso crer do amanhã, porque Ele vive, temor não há […] A minha vida está nas mãos do meu Jesus, que vivo está…” Compreendi o quanto estava vazia, sendo possível ser levada pelo vento, enquanto aquele senhor estava firme em uma rocha que não se moveria jamais. Com o espírito puro e sóbrio em uma manhã fresca, eu vi que ele tinha tudo, porque o amor de Deus o havia preenchido. Dentro dele, não havia necessidade de mais nada.
“Deus enviou seu filho amado
Para perdoar, pra salvar
Na cruz morreu por meus pecados
Mas ressurgiu e vivo com o pai está
Porque ele vive, posso crer no amanhã
Porque ele vive, temor não há
Mas eu bem sei, eu sei, que a minha vida
Está nas mãos do meu Jesus, que vivo está
E quando, enfim, chegar a hora
Em que a morte enfrentarei
Sem medo, então, terei vitória
Irei à glória, ao meu Jesus que vivo está
Porque ele vive, posso crer no amanhã
Porque ele vive, temor não há
Mas eu bem sei, eu sei, que a minha vida
Está nas mãos de meu Jesus, que vivo está.” — Porque Ele vive, Harpa Cristã
Depois de arrumar o que lhe pertencia, caminhou em direção a um mercado que cortava as ruas da cidade. Uma mãe e seu filho passaram por ele. Provavelmente, não se conheciam, mas não há como ter certeza sobre isso. Por uma visão consideravelmente distante, o contexto permite dizer que se encontraram somente naquele momento. Após uma pausa, houve um comentário, e aquele menino aproximou-se dele, oferecendo alguma coisa. A imagem daquele acontecimento foi se desfazendo conforme os meus passos levavam-me ao meu destino, distanciando deles.
Não sei dizer, pelo modo tão corriqueiro do dia, se nos olhos daquele homem via-se o Nazareno, nem se aquela criança tinha o espírito do menino Jesus. Mas que Cristo estava no meio deles, percebia-se de longe. Agora, durante o anoitecer, o mesmo hino de esperança comove-me, sabendo que o Carpinteiro vive, e por isso, o amanhã já foi construído para nós.